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Registros de ocorrência por estelionato no DF dobram no período da pandemia

 

Dados obtidos pelo Correio por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) revelam que, em 2018 e 2019, a capital teve menos de 30 mil ocorrências. Na pandemia, em 2020 e 2021, foram 67 mil boletins

Golpe da falsa vaga de emprego, do cheque, do SMS e até do WhatsApp. Estelionatários têm se aproveitado da pandemia causada pelo novo coronavírus para atrair novas vítimas. Em 2020 e 2021, os dois primeiros anos mais críticos da crise sanitária, o número de casos de estelionato registrados pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) dobrou. Dados obtidos pelo Correio por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) revelam que, em 2018 e 2019, a capital teve menos de 30 mil ocorrências. Na pandemia, em 2020 e 2021, foram 67 mil boletins.

Para se ter uma ideia da proporção dos dados, no mesmo período foram notificados 57 mil crimes contra o patrimônio (roubos e furtos) na capital  — 6,8 mil ocorrências a menos do que a de estelionatos. O aumento foi tão significativo que, se todos os boletins, tivessem sido registrados em uma única cidade (no Recanto das Emas, por exemplo), cerca de metade da população teria sido vítima dos golpistas.
A maior parte dos golpes aplicados em 2020 e 2021 tiveram como vítimas moradores do Plano Piloto: foram 11 mil registros nos últimos dois anos, o que corresponde a 17% do total. Antes da pandemia, quase 25% dos estelionatos eram cometidos no Plano — 1 a cada 4 golpes aplicados no DF aconteciam na região.
A segunda cidade onde mais são relatadas tentativas de golpe é Taguatinga, com seis mil ocorrências (10%). Em seguida, aparece Ceilândia (9%), Águas Claras (7%) e Guará (6%).

Horário comercial

O levantamento obtido pelo Correio mostra, ainda, o horário em que os golpistas preferem atuar. Isto porque, ao registrar o boletim, a pessoa também precisa relatar à polícia a data e horário que o golpe foi aplicado. Diante disso, ficou constado que a maioria dos crimes aconteceu em dias de semana, no horário comercial. Poucos golpes foram relatados no período da noite ou da madrugada.

Especialista em segurança pública, Leonardo Sant’Anna explica que o DF concentra a maior quantidade per capita de conectados, além de ter uma das maiores rendas. “Temos a maior quantidade de internautas com rendas superiores proporcionalmente falando. Isso nos coloca numa condição diferente, mais visado pelos criminosos”, enfatiza.
Quanto a Brasília apresentar mais quantidades de registros, o especialista afirma que a explicação vem do fato de concentrar maior renda, diferente das outras regiões. “O Brasil continua sendo um dos grandes recordistas de depressão e ansiedade. Junto a isso temos profissionais dessas fraudes, que são capazes de fazerem leituras psicológicas e identificarem as melhores vítimas, pois eles se valem da fragilidade emocional”, destacou.

Organizações criminosas

Diferente de outras regiões do país onde o maior número de registros da atuação de organizações criminosas é relacionado ao tráfico de drogas, no DF, o foco das quadrilhas é ganhar dinheiro enganando o cidadão. Dos 16 boletins, que foram registrados em 2021 com a indicação do crime de organização criminosa, a maior parte das ocorrências (4) está relacionada ao estelionato.
Os crimes de “furto mediante fraude”, “uso de documento falso” e as atividades enquadradas como “crime praticados pela internet” tiveram duas ocorrências de organização criminosas cada. A lavagem de dinheiro também aparece como a atividade indicada em dois BOs relacionados a quadrilhas.
As demais ocorrências que mostram a atuação de grupos criminosos se relacionam a outros crimes como extorsão, maus tratos e o tráfico, que tiveram um registro do tipo em 2021.

Crime virtual

Para aplicar golpes, ameaças, injúrias, furtos, pedofilia e até extorsões, criminosos intensificaram o uso no meio virtual. Em 2019, o DF registrou 7.613 ocorrências por crimes praticados pela internet. Esse número ficou praticamente quatro vezes maior ao se comparar com os dois anos seguintes, em 2020 e 2021, período em que as pessoas ficaram mais em casa, chegando a um total de 30.273 notificações.
Os dados apontam baixa de apenas 1,2% em delitos praticados pela internet entre 2020 e 2021: foram 15.233 contra 15.040 ocorrências. Apesar da redução, os crimes estelionato, extorsão, stalking (perseguição), pedofilia e violência psicológica contra a mulher aumentaram em um ano.
Os estelionatos aparecem em primeiro lugar no ranking dos crimes que apresentaram crescimento entre 2020 e 2021: das 7.484 ocorrências, o número passou para 9.621. As extorsões subiram em 26%, passando de 168 para 212. O stalking passou de 18 para 156; pedofilia, de cinco para 16 notificações; e os crimes de violência psicológica contra a mulher foram de duas para 19 ocorrências.
“Há um volume gigante de pessoas que passaram a usar o meio virtual na pandemia. Junto a isso, vem o anonimato vinculado à solidão. Por exemplo, você tem alguém sozinho, em casa, sem ninguém para conversar, sem poder sair, confinado, e você pode criar o seu novo ‘avatar’. Esse ‘avatar’ virtual qualquer um passou a poder criar nesse novo ambiente. Mas isso vem conectado com todas as faltas de cuidado. Não há uma rede básica de proteção”, finalizou Leonardo.

 

Três perguntas para Dário Freitas, delegado da Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (DRCC)

– Quais são os crimes mais praticados pela internet? E por quê?
O número de pessoas inseridas no universo digital no Brasil cresce de forma exponencial todos os anos. Cada vez mais os cidadãos aderem à internet, seja por redes sociais, transações comerciais, comunicações e etc. Tudo tem circulado em torno desse mundo virtual. Celulares, computadores, microdispositivos são uma realidade e precisam ser levados a sério, já que com eles, as formas de cometer crimes, também têm se modificado e feito vítimas, mesmo nos ambientes que eram considerados seguros, ou seja, a nossa casa.
Na mesma medida em que os cidadãos são incluídos no contexto digital, igualmente estarão vulneráveis com os perigos desse novo mundo digitalizado e sequer têm consciência dos perigos ali presentes. Há muito apelo para o uso das maravilhas da internet, no entanto os riscos e as medidas de segurança são, como regra, ignorados.
Os crimes cibernéticos de natureza financeira, como invasão de computadores, estelionatos, além de golpes gerais de extorsão, tiveram um aumento considerável, sendo que em grande parte das ações tiram proveito da pandemia. Delitos relacionados à pornografia infantil também tiveram aumento considerável.
– Na sua avaliação, é mais fácil praticar um crime pela internet? Seja estelionato ou pornografia, por exemplo? Por que os criminosos estão procurando mais o espaço virtual para isso?
Tendo em vista a existência de legislação tímida para o tema, o volume de crimes cibernéticos no Brasil vem crescendo, sobretudo em tempos de pandemia. Um dos fatores para o aumento seria o desenvolvimento de uma maior dependência dos sistemas conectados.

Pode me contar um pouco sobre o trabalho investigativo da polícia no combate a esse tipo de crime?
A investigação se inicia com a instauração do inquérito policial ou termo circunstanciado, que será feita após a denúncia do crime em alguma delegacia, portanto, doravante, começa a fase da apuração de provas. Procuramos manter na íntegra a comprovação probatória adquirida, pois para este tipo penal, todo ato feito por algum dispositivo eletrônico, deixa algum tipo de rastro codificado em alguma rede de dados, inclusive na deep web. A investigação dos crimes cibernéticos é feita através de uma análise técnica, que permite verificar a autoria e materialidade dos crimes praticados por meio de uma rede que interliga os computadores.

 

 

 

 

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